A Globo quer convencer os professores de que eles não devem ter aumento

Na retórica golpista empregada pelos meios de comunicação tradicionais evoca-se o fato de os professores merecerem este aumento, mas afirma em seguida que é inviável porque não há saldo nos cofres públicos.

Professores de São Paulo (Foto: Apeoesp)
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“Na história do pensamento econômico as controvérsias são resolvidas não porque uma das teses foi falsificada, mas sim porque a outra comandou maior poder de convencimento. Controvérsias se resolvem retoricamente; ganha quem tem maior poder de convencer, quem torna suas ideias mais plausíveis, quem é capaz de formar consenso em torno de si"[1], explica o professor Pérsio Arida.

Claro que o professor estava se referindo ao debate acadêmico das teorias econômicas, mas podemos ampliar esta questão para a opinião pública.

Em sua escalada sórdida e nefasta, o grupo Globo vem buscando convencer toda a sociedade que o Estado está falido e que qualquer investimento estatal é inviável. Questiona-se sempre: “da onde será tirado o dinheiro"?

Retórica golpista

A última da vez é o aumento que Bolsonaro quer dar para os professores. Na retórica golpista empregada pelos meios de comunicação tradicionais evoca-se o fato de os professores merecerem este aumento, mas afirma em seguida que é inviável porque não há saldo nos cofres públicos.

Ou seja, esta afirmação só diz que mesmo que o governo não fosse o de Bolsonaro, não deveria haver aumento algum para os professores. Estes devem se convencer porque é algo que não se explica apenas por palavras ou interesses políticos, mas porque é algo matemático.

De fato é matemático, contudo trata-se de uma tese econômica inspirada no modelo neoclássico dos finais do século XIX que, por sua vez, desembocou na segunda metade do século XX no neoliberalismo. Reduz-se a economia à matemática escondendo assim sua dimensão social, seu contexto histórico etc.. Outras teses como as de Keynes, da Teoria Monetária Moderna, do Desenvolvimentismo Social etc.. entendem que Estado deve gastar sim, mesmo não tendo saldo no caixa porque haverá retorno futuro.

Essas teses não entendem que o funcionamento do Estado é o mesmo que de uma família que deve economizar porque o salário tem um limite. Não. O Estado trabalha com investimentos...

Mas esses economistas estão na academia. Não podem competir com uma indústria midiática que tem um amplo poder de convencimento e alcance. Miriam Leitão, Carlos Alberto Sardenberg e outros estão a serviço do grande capital especulativo que não quer que o Estado entre no jogo econômico para competir com capital privado.

Desde McCloskey sabe-se que não são os métodos dos economistas que dobram as pessoas a tese defendida, mas sua habilidade retórica. Não há habilidade retórica que possa disputar terreno com as corporações midiáticas. Elas estão em todo lugar. Controlam a opinião pública. É a retoricidade por excelência. De modo que estas conseguem fazer o oprimido a defender a tese do opressor, como no caso dos professores, no qual estes devem acreditar que de fato não há como ter seus parcos salários aumentados.

Devemos ser contrários a Bolsonaro, mas não contrários a melhora das condições de vida. Sabemos que nem é Bolsonaro que irá pagar pelo aumento. Sabemos também que é uma jogada política suja e asquerosa. Não podemos ser iludidos pelos críticos à Bolsonaro. Precisamos da crítica da crítica crítica. A luta dos professores por um salário digno é central. Já dizia Paulo Freire: “a luta em favor do respeito aos educadores e à educação inclui que a briga por salários menos imorais é um dever irrecusável”.[2]


[1] ARIDA, P. A História do pensamento econômico como teoria e retórica. In: GALA, P. e REGO, J. M. (orgs.) A História do pensamento econômico como teoria e retórica: ensaios sobre metodologia em economia. São Paulo: Ed. 34, 2003, p. 34.

[2] FREIRE, P. Pedagogia da autonomia. São Paulo: Paz e terra, 1996, p. 74.